18 de outubro de 2017

DIA DO MÉDICO

Três e vinte da madrugada. O celular toca. O médico demora um pouco para atender. Está cansado. Na noite anterior realizou uma cirurgia delicada. A enfermeira plantonista informa que é uma emergência. Às presas ele se veste. Com o barulho, o filho, de apenas três anos de idade, acorda. Passando as pequenas mãos nos olhos, pede que o pai o pegue no colo. O cirurgião apenas balança a cabeça negativamente. Não tem tempo para explicar os motivos. Ademias, ele não entenderia. A esposa, já acostumada, apenas sorri. Beija-o e deseja boa sorte.

O doutor entra no carro e sai em disparada. Ultrapassa o limite permitido de velocidade. Quase se envolve num acidente. Ao adentrar no hospital é agarrado pelos familiares do doente. Desesperados, pedem todo seu empenho. A enfermeira passa o diagnóstico. Ele entra na sala de cirurgia. A operação é complicada. Dura aproximadamente quatro horas, mas o resultado é compensador: o paciente está salvo. O médico fica mais feliz que a própria família do enfermo.

Retorna para casa, toma banho, veste-se rapidamente. Beija a testa do filho - já acordado - e, novamente, sai correndo. Há várias consultas marcadas na clínica. Às 12h, divide o tempo almoçando, acompanhando os noticiários, conversando com a mulher e brincando com o filho. Queria ficar mais tempo. Não dá. Às 13h30 tem outra cirurgia. Depois, precisa visitar os pacientes internados e, por fim, uma reunião com os colegas.


Já é noite. Totalmente exausto, liga ao amigo e diz que não irá na partida de futebol, seguida de churrasco. O amigo protesta. Reclama que é a terceira vez que ele adia o divertimento.     No trajeto para casa, atende o celular. É sua mãe lembrando que há tempos o filho não ‘manda notícias’. Diz que está preocupada. O médico, mesmo cansado, recorda-se da última vez que os visitou. 

Chega em casa. A esposa e o filho o esperam. Ele pensa em jantar fora. A exaustão interrompe a intenção. O filho diz que no final de semana quer ir ao parque. Ele responde que não será possível. Motivo: estará de plantão. Quando vai sugerir que o passeio fique para o outro final de semana, lembra-se que viajará. Vai fazer mais um curso.

O filho quer brincar. A esposa pede mais atenção. Os pais exigem notícias. Os amigos cobram que ele participe dos encontros. Antes de pensar em tudo isso, o médico adormece. Sequer lhe sobra tempo para pensar no cotidiano.

Essas mal traçadas linhas são para que tenhamos uma minúscula noção do ‘outro lado’ da vida do médico. São, também, para compreendemos que, muitas vezes, essa gente sofre mais do que o próprio paciente.