Victor era um
buon vivant. Tinha tudo do bom e do
melhor. Sempre, nas férias de julho, viajava aos Estados Unidos para curtir as
praias do Sul da Califórnia. Era milionário.
Juliana, ao
contrário, tinha uma vida sofrível. Acordava às 4h30 para trabalhar no
camelódromo. Não tinha hora para voltar. Ou melhor, só retornava para a pequena
casa, que dividia com o pai doente e dois irmãos menores, quando conseguia
dinheiro suficiente para a comida e os remédios.
O infortúnio
da jovem morena clara começou na adolescência. Quando tinha 13 anos a mãe
fugiu. Um ano depois, o pai, bêbado que estava, caiu de uma escada e ficou
paralítico. A cadeira de rodas não foi suficiente para que abandonasse o hábito
de ingerir bebidas alcóolicas. O vício lhe trouxe uma cirrose. Quando a mãe
abandonou a família contou com a ajuda de uma tia, vítima fatal de uma bala
perdida dois anos mais tarde.
Mesmo a vida
sendo-lhe madrasta, Juli não desanimava. Trabalhava arduamente. Continuou os
estudos. E o principal: não se deixou atrair pela vida fácil. Constantemente
era grosseiramente cortejada por homens ricos de dinheiro e pobres de espírito.
Esquivava-se até com certa elegância. Enfrentava com maestria os obstáculos do
cotidiano.
Nessas
coincidências, que só Deus explica, Victor conheceu Juliana. E, como numa
novela mexicana, se apaixonou pela jovem de trajes simples, porém limpos e bem
passados, que vendia bijuterias por valores módicos. Ele flertou com ela.
Passados alguns dias o namoro começou. Um amigo até tentou demovê-lo da ideia.
Inútil. Casaram-se.
Apesar das
insistências contrárias de Juliana, Victor casou com comunhão de bens. A
primeira providência dela foi melhorar a vida do pai e dos irmãos. Recusou um
carro importado que o marido ofereceu-lhe. Também abdicava das roupas de grife.
Sempre se opôs as extravagâncias do esposo.
Sofria com o
preconceito da família e os olhares pouco amistosos dos parentes e amizades do
marido. A bela morena garantia que o amava e não lhe interessava seus bens.
Depois de seis meses de matrimônio, Juliana sofreu um nove revés: Victor morreu
num acidente automobilístico.
No enterro,
com os olhos marejados, a jovem viúva interpretou o calor atípico para aquele
dia de inverno como um sinal para provar sua boa intenção enquanto esteve ao
lado do esposo. Ela, então, abriu mão da herança. Pegou apenas o suficiente
para montar novamente uma barraca no camelódromo.