O ano: 2003. O dia: sábado à noite. A cidade: Chapecó. O show: Titãs. O
local: Estação Brasil. Depois da apresentação, o casal - à época noivos - com o
qual eu fui e retornaria no dia seguinte se deslocou ao hotel. Eu segui outro
rumo. E até hoje não lembro o que realmente aconteceu naquela madrugada.
Na verdade parecida que tudo já estava planejado. Não a conhecia, mas
várias vezes nos encaramos. Confesso que prestei mais atenção nela, ignorando
Branco Mello e sua turma que tocavam as clássicas da banda de rock.
Terminada a apresentação nos esbarramos propositalmente. Perguntou-me se
estava de carro. Disse, então, que era de São Miguel e vim e voltaria de carona,
por volta das 12h do domingo – meu carro, devido ao descuido de um jovem, que três
dias antes me cortou a frente, estava no conserto. “Liga para seu amigo e diz
que está tudo bem. Se for o caso amanhã eu lhe levo a São Miguel ou, no mínimo,
à rodoviária”, disse, ou melhor, ordenou a loira dos olhos verdes.
Acatei a ordem. Entramos no carro dela e saímos. Ela ligou o som e a
primeira pergunta que fiz foi se ela sabia o nome da música que estava tocando. "Seven Nation Army - The White Stripes", respondeu, adiantando que só
ouviríamos aquela canção. “Isso é som de verdade”, acrescentou, diga-se de
passagem com toda razão.
“Para onde vamos?”, indaguei. “Está com medo?”, retrucou. Disse que não,
mas era meu direito saber. “Não se preocupe”, limitou-se a dizer. Aumentou
o volume e me ofereceu um cigarro. “Não fumo”, respondi (confesso, porém,
que naquele tempo bebia demasiadamente - hábito que abandonei definitivamente
em julho de 2004).
Depois de aproximadamente dez minutos seguimos por uma estrada de chão.
Nada falei. Nem ela. Passados aproximadamente 15 minutos chegamos a uma casa.
“É a chácara dos meus pais”, informou. A lua cheia colaborou para perceber que
a residência era grande e bonita com um belo jardim e uma piscina aos fundos.
Entramos e fomos a um dos quartos. Ligou o condicionador de ar e foi ao
banheiro. Quando saiu fiz o mesmo. Ao retornar ela cheirava um pó branco que
presumi ser cocaína. Sorrindo, olhou para mim e sussurrou: “fique à vontade”. Apenas articulei
com a cabeça negativamente.
Sem pedir autorização fiquei descalço e deitei na cama. Olhamo-nos. Ela
desligou a luz e acionou o abajur. Sem nenhum constrangimento, começou a despir-se.
Seminua, deitou-me ao meu lado. Começamos a conversar. Reparei que seus olhos
estavam marejados.
O choro veio em seguida. Só me restou questionar o motivo. Nada
respondia. Abraçou-me e relatou-me acontecimentos que, juro, até hoje não sei
se ela falou ou eu sonhei. E até hoje não consigo recordar se aconteceu ou não
algo a mais.
Por volta das 11h acordamos. Tomei um banho rápido e pedi que me levasse
ao local onde havia combinado que almoçaria com meu amigo e sua companheira. Fui
prontamente atendido. Durante o trajeto nenhuma palavra. Apenas a música Seven
Nation Army.
Parou em frente ao restaurante e, quando ameacei falar alguma coisa, ela
apenas disse - em um tom ríspido - tchau. Nunca mais a vi. Nem sei o nome dela.
Nem ela o meu.