5 de abril de 2015

IRONIA DO DESTINO

O farmacêutico não chegou a se assustar com o palavrão que Alberto proferiu. Já estava acostumado. Toda sexta-feira, depois das 18h, Bola, como era conhecido, ia à balança. A rotina era sempre a mesma: o peso sempre aumentava e ele, como que automaticamente, dizia um monte de asneiras.

Também já era costume de Alberto gastar horrores na compra de remédios e chás para emagrecer. Aliás, devia ser por isso que o proprietário e os funcionários toleravam seus ataques de fúria.

A exemplo de sua barriga, a conta bancária de Alberto também era gorda. Ele era inteligente. Pertencia a uma família tradicional.

A verdade é que Bola realmente era muito gordo. Para piorar, tinha problema de compulsão: era o primeiro a sentar e o último a sair da mesa. Como se não bastasse, detestava exercícios físicos.

Os amigos de Alberto tinham menos dinheiro que ele. Em compensação não tinham a gordura dele. Praticamente todos faziam sucesso com as mulheres. Nesse ponto residia a maior frustação do Bola. Ele tinha consciência que as moças lhe diziam não por causa do seu peso.

Mas tudo isso não chegava a lhe abalar. Era fanfarrão. Sempre bem humorado, chegava a fazer piada de si mesmo. Era uma companhia agradável. Reclamava, apenas, de seu peso e de não conseguir diminui-lo.

Andréia era a única que dizia gostar de Alberto. No entanto, ele não queria nada com ela. Até a esnobava.

Ninguém entendia o fato de Andréia gostar do Bola. Não era por dinheiro, pois tinha até mais do que ele. A curiosidade de todos aumentava por ela ser bonita e atraente. Mas não adiantava. Os olhos verdes, aliados a pele morena clara e ao corpo perfeito não sensibilizavam Alberto.

Num sábado, depois de uma festa, Alberto deu carona para Andréia. A minissaia da moça mexeu com os instintos dele. Os dois   , que tinham bebido além da conta, acabaram num motel.

No domingo, Alberto, contrariando a si mesmo, ligou para Andréia que ficou surpresa. Os dois saíram. Jantaram juntos. E jantaram muitas outras vezes.

Para espanto de todos, cinco meses depois daquela festa, Alberto anunciou o noivado. As amigas estranharam o fato de Andréia não ter se entusiasmado com a ideia. Mais estranho ainda é que Andréia começou a renegar Alberto. Ele, que tinha um bom-senso de “semancol”, começou a perceber. Junto com a percepção veio à preocupação. E, com as duas, chegou à depressão. 

Bola era a tristeza em pessoa. Não saía mais e, por incrível que pareça, se alimentava mal. Quando ia à farmácia não se dirigia à balança. Também não comprava mais comprimidos para emagrecer, mas, sim, antidepressivos. É que Andréia o esculachava. Todo mundo sabia que ela tinha outro. Estava com Alberto por piedade.

Em pouco mais de dois meses, Alberto emagreceu mais do que todos os regimes que fez juntos. Ficou magro. Agora as mulheres que o tinham rejeitado corriam atrás dele. Chegou a tal ponto que se obrigou a trocar o número do celular. Os amigos afirmavam que queriam estar na pele de Alberto. Entretanto, junto com os quilos extras, a alegria de outrora também se foi.

Bola, que sempre dizia que só seria feliz se emagrecesse, conseguiu ficar magro, porém triste.

O destino foi irônico com Bola. Ontem, quando era gordo e não queria nada com Andréia, que o amava, era feliz. Hoje, magro e apaixonado por Andréia, que não o quer mais, é infeliz. 

E quando nos recordamos da história de Alberto sempre chegamos a conclusão que é inútil condicionar a felicidade aos desejos da estética e não aos da alma.